Blogue de divulgação cultural, escrito por 28 pessoas. Um texto por dia, todos os dias.

sábado, 1 de dezembro de 2012

Memória... já se esqueceram?

por Filipa Lima

“Não somos apenas o que pensamos ser.
Somos mais; somos também, o que lembramos e aquilo de que nos esquecemos;
somos as álavras que trocamos, os enganos que cometemos,os inpulsos a que cedemos, "sem querer"”
Sigmund Freud


O nosso dia-a-dia é extremamente influenciado pelas nossas vivências passadas e pelas nossas aprendizagens, ou seja, por aquilo que vamos armazenando connosco. Os momentos mais importantes na nossa vida, aqueles que por algum motivo nos marcaram de alguma forma, são os que habitualmente demoram mais tempo a se desvanecer da nossa memória. Contudo, apesar de certos acontecimentos na vida adulta nos marcarem de forma semelhante a acontecimentos da infância, e embora as nossas vivências da infância tenham ocorrido há mais tempo, na maioria das vezes, as memórias de quando somos crianças são mais claras e precisas do que as que ocorrem posteriormente. 

Será por as memórias mais recentes serem menos preenchidas, devido à monotonia que a vida adulta e, sobretudo a terceira idade, pressupõe? Será porque na infância damos uma importância exagerada a todos os acontecimentos e na vida adulta, devido à experiência de vida e aos inúmeros acontecimentos porque já passámos, deixamos de dar tanta importância ao que nos rodeia e, portanto, menos guardamos na memória? Será apenas o normal curso do processo cognitivo? O certo é que os factos antigos têm mais tempo para se fixar no nosso “banco de dados”, o que não ocorre com os acontecimentos recentes, que têm pouco tempo para se fixarem e este processo pode ainda ser alterado devido a razões relacionadas com as variações do estado emocional ou problemas de ordem física.
Assim, memória é a “função geral de conservação de experiência anterior, que se manifesta por hábitos ou por lembranças; tomada de consciência do passado como tal”. 

Esta assume uma importância enorme nas nossas vidas, permitindo-nos recordar desde atos tão simples como andar, falar, comer, a outros mais complexos como acontecimentos da nossa infância, passagens de um livro que gostámos, o rosto dos nossos familiares e amigos, e até, por vezes, o rosto de um desconhecido que passou por nós na rua e por algum motivo nos chamou à atenção. Quando estávamos na escola e os nossos pais e professores diziam “não decores a matéria, percebe-a”, eles tinham razão. Realmente, só é possível memorizarmos algo, a longo prazo, se conseguirmos compreender o seu significado. O próprio significado das palavras, por exemplo, só se aprende através de mecanismos que permitam deduzir o seu significado através do contexto, sendo por isso um processo ativo e de certo modo não explicito.

No processo de memorização existe a fase de codificação, armazenamento e recuperação da memória. A codificação consiste na perceção da informação, o armazenamento no manter dessa informação e a recuperação no recordar da informação, previamente armazenada. Assim, pode-se distinguir memória a curto prazo de memória a longo prazo, dependendo do tipo de armazenamento efetuado. 

A memória a curto prazo é a memória imediata, recente, sendo que o seu conteúdo vai desaparecendo se não for feito um esforço para o manter, como a repetição. Um exemplo é a memória de trabalho, que é processada no córtex pré-frontal, estando ainda associada às áreas responsáveis pela fala e pela perceção das palavras e às áreas de associação visual. 

A memória a longo prazo resulta da consolidação de memória ou traços de memória de curto prazo e pode ser implícita ou explícita. 

A implícita (não declarativa) engloba a aprendizagem não intelectual, ou seja espontânea, do reconhecimento de factos e acontecimentos e inclui a aprendizagem de tarefas motoras, como quando aprendemos a andar, por exemplo. É baseada na repetição. A memória explícita (declarativa), por sua vez, é a que permite a recordação intencional de factos ou acontecimentos sejam eles a respeito da nossa vida pessoal, ou factos genéricos do mundo (é provavelmente este tipo de memória que tanto ansiamos em épocas de exames).


No nosso cérebro uma das regiões mais importantes no processo de memória a longo prazo é o hipocampo (imagem da esquerda) que atua através de um conjunto de fenómenos químicos e outros ainda desconhecidos, transformando memória a curto a prazo em memória a longo prazo. 

Quando o hipocampo é lesado não é possível formar novas memórias e a pessoa fica com a sensação de estar a viver num local estranho, onde todas as suas vivências se desvanecem, mesmo que memórias mais antigas, anteriores à lesão, permaneçam intactas. A amígdala (imagem da direita), também é extremamente importante na memória, pois faz conexões entre os estímulos sensoriais vindos do meio externo como o som, cheiro, sabor, visão e tato e os sistemas sensoriais do córtex cerebral.


A memória está intimamente relacionada com a nossa capacidade cognitiva e com o nosso comportamento, sendo que cada vez que aprendemos alguma coisa ou adquirimos uma nova experiência, as células do nosso cérebro sofrem uma alteração e isso reflete-se no nosso comportamento. 

Cada neurónio contribui, então, para o comportamento e para a atividade mental através da condução ou da inibição da condução de impulsos, e são essas descargas que explicam todos os processos da memória. Um exemplo disto é quando passamos numa rua, à noite, e nos apercebemos da presença de um grupo de pessoas com aparência estranha e perigosa. Nas próximas vezes, evitaremos passar por lá novamente. O mesmo acontece, por exemplo, quando levamos um choque por tocarmos numa tomada elétrica e daí para a frente passamos a evitar repetir esse ato.

Torna-se frustrante quando tentamos, de todas as formas possíveis, recordar algo e simplesmente não conseguimos. Ora, a memória, embora tão complexa, tem também limitações e tal como a maioria dos processos biológicos também é afetada pelo envelhecimento.

Todos nós já devemos ter conhecido um avô, uma avó, um tio ou outro qualquer idoso com diminuição da capacidade de memória. Ora, a perda de memória preocupa-nos e talvez seja a sua associação, em grande parte das vezes, com o envelhecimento, que nos faz pensar que um dia, também nós, teremos dificuldade em recordar acontecimentos que agora nos parecem tão claros e impossíveis de esquecer. 

De facto, a perda de memória pode estar associada à demência, como a doença de Alzheimer, contudo, também determinadas doenças neurológicas, distúrbios psicológicos (stress, ansiedade, depressão…), problemas metabólicos (falta de vitamina B e hipotiroidismo) e intoxicações (alcoolismo) podem levar à perda de memória. O próprio traumatismo, a vida sedentária, com excesso de preocupações e insatisfações, bem como uma dieta deficiente favorecem essa perda. O mecanismo pelo qual a memória é afetada não está completamente esclarecido.

Após um resumo do processo de memorização, eu podia continuar e escrever até me esquecer do verdadeiro propósito deste texto ou até a minha memória falhar, mas não. Também não quero ocupar a vossa memória com assuntos da memória.




Sem comentários:

Enviar um comentário