No mundo real o absurdo apoderou-se das nossas vidas e permitiu que uma criança de 12 anos tivesse “chumbado” o 6º ano de escolaridade com nota positiva a todas as disciplinas.
Loucura? Insanidade?
Uma criança que ao entrar para o segundo ciclo de escolaridade trazia consigo uma enorme falta de autoestima, uma criança que não valorizava a escola e que não acreditava na possibilidade de ter sucesso como outros colegas da sua turma.
Professores houve que a estimularam e lhe deram todo o apoio para que ganhasse confiança em si própria. A criança esforçou-se, ganhou confiança e acreditou que era possível com o seu esforço e o apoio dos professores conseguir ultrapassar todos os obstáculos que lhe tinham impedido de avançar.
Mas uma lei e a negligência dos seus progenitores deitaram tudo por terra.
Dando sequência à legislação que entrou em vigor a nível nacional, em março de 2012 é emanada, pela Secretaria Regional da Educação e Formação, a Portaria nº29/2012 que tem como objeto e âmbito o estabelecimento de princípios e procedimentos a observar na avaliação das aprendizagens e competências, assim como os seus efeitos.
No artigo 2º são definidas as finalidades da avaliação sendo referido na a) do ponto 2 que a avaliação visa “Apoiar o processo educativo de modo a promover o sucesso dos alunos, permitindo o reajustamento dos projetos curriculares de escola e de turma, nomeadamente quanto à seleção de metodologias e recursos, em função das necessidades educativas” e na b) refere que a avaliação propõe-se “Certificar as aprendizagens e as competências desenvolvidas pelo aluno no final de cada ciclo e à saída do ensino básico, através da avaliação sumativa interna e externa”.
À avaliação sumativa externa (artigo13º da referida portaria) incide sobre as áreas curriculares de Português e Matemática estando a ela sujeitos os alunos do 6º e 9 anos. A classificação final a atribuir a cada uma destas disciplinas integra a classificação obtida pelo aluno na prova final, com uma ponderação de 30%.
Só que este artigo tem um ponto 10 assassino que diz literalmente que “A não realização das provas referidas (…) implica a retenção do aluno no 6.º ou 9.º anos de escolaridade (…)”
A criança que “chumbou” o 6º ano de escolaridade com nota positiva a todas as disciplinas fez a prova externa de Português, mas no dia da prova de Matemática estava indisposta/doente e não compareceu para a realização da prova.
É bom dizer que teria sido suficiente a criança ter comparecido na prova, ter assinado o seu nome e não ter realizado qualquer exercício para que passasse de ano.
Ainda foi feito um esforço para que os pais se dirigissem a um médico que comprovasse, com um atestado, a indisposição/doença da aluna, mas estes não “mexeram uma palha”.
O histórico familiar desta criança é de alcoolismo e violência doméstica. A negligência e provavelmente a falta de dinheiro para pagar um atestado falou mais alto e quem pagou de uma forma absurda e cruel foi uma criança que está agora a frequentar o 6º ano pela segunda vez, completamente desmotivada, injustiçada e com uma autoestima no nível igual ao que a educação atingiu - abaixo de qualquer nível.
No mundo real, a criança conseguiu atingir todos os objetivos, em todas as disciplinas, chegou ao fim de um ciclo em que foi avaliada positivamente por todos os seus professores.
No entanto, a negligência familiar aliada a uma lei estúpida, que contraria o conceito pedagógico de avaliação implícito na própria lei, recusa a possibilidade de progressão, ato de justiça que merece ser executado.
Este artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico.
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