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sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Polémica: Ideais ou Propaganda?


por Isabel Chalupa

Aproveitando a deixa do novo filme de Paul Thomas Anderson (um dos meus realizadores favoritos, por sinal), The Master, que se foca alegadamente no tema da Cientologia, venho hoje falar-vos de polémica no Cinema. Todos os filmes que procuram tocar assuntos sensíveis enfrentam uma grande dúvida: serão feitos como um afirmar e defender dos ideais em que os seus realizadores acreditam ou como simples movimento de mercado? Grito de alerta ou golpe propagandístico? Arte ou entretenimento?

De facto, não só a obra referida, como muitas outras caminham sobre esta ténue linha que distingue os filmes que pretendem passar uma mensagem daqueles que simplesmente procuram atrair espectadores às salas com uma premissa sumarenta. Títulos como A Rainha, W., Frost/Nixon e o vindouro Diana pegam em assuntos delicados e discursam sobre os mesmos sem quaisquer pruridos ou medo da crítica sensacionalista. Embora os filmes enunciados sejam obras de grande nível, nem todos os exemplos no mundo do Cinema podem assim ser considerados. Pegar em assuntos políticos está na moda, resta perceber se para criticar ou fazer dinheiro...

Porém, compreenda-se que por vezes a publicidade e a imprensa pegam num filme e transformam-no em algo completamente diferente. Pegando especificamente em The Master, PTA veio afirmar publicamente que não é sobre a Cientologia, tendo apenas pegado no exemplo da ceita/religião em questão por ser um tema tão badalado nos dias de hoje. De facto, as parecenças da personagem de Philip Seymour Hoffman com L. Ron Hubbard, o criador da Cientologia, são assinaláveis, tal como as situações em que o filme se movimenta. Contudo, como o realizador já referiu por diversas vezes, este é um conto sobre dois homens, um que gosta de orientar e outro com sentimentos antitéticos sobre ser orientado, que se cruzam e constroem uma relação peculiar. Alguém entrevê nesta descrição uma reflexão sobre a Cientologia e as suas mentiras e controvérsias tão faladas?



Não obstante, a imprensa e a própria máquina de promoção de The Master insistem na mesma tecla: guerra aberta contra a Cientologia por todo o mal que esta provoca. No entanto, será de facto pelos males da ceita/religião que os media chovem no molhado ou porque anunciar um tema tão controverso é fonte certa de dinheiro? P. T. Anderson é um realizador distinto, respeitável e com as suas próprias ideias estéticas, morais e comportamentais. Não é um Michael Bay, que realiza filmes de máquinas-veículos falantes só porque os mesmos dão origem a cheques com muitos zeros. Não pretendo julgar tal opção – pelo contrário, admiro quando feito às claras, não quando (como no caso do mecanismo de marketing da obra de PTA) disfarçam um filme de algo só para atrair a clientela. The Master é decerto uma película singular e a ideia pré-definida que a comunicação social tem criado à sua volta poderá prejudicar o entendimento do filme como reflexão sobre a condição humana e as relações interpessoais.

Concluindo, é bem sabido que hoje em dia temas polémicos são fonte certa de papel verde. Todavia, tal controvérsia é muitas vezes originada pelos media em si, que mascaram um filme de outro com o mero propósito de atrair o espectador comum às salas. Ainda assim, isto não invalida que uma obra produzida e promovida nesses moldes seja de qualidade: casos como os acima referidos foram apresentados como ensaios sobre temas delicados e nem assim deixaram de ser títulos de alto quilate. Tudo depende do que repousa sob todo aquele mecanismo propagandístico: se o que encontramos é arte, não devemos hesitar em dar uma espreitadela. Até porque podemos estar perante uma verdadeira obra-prima.

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